terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Uma morte, um livro, e a felicidade

Esta semana perdi uma prima. Era prima afastada, vivia na costa Vicentina entre o Alentejo e o Algarve e tinha apenas 45 anos. Lembro-me de a ver em miúda e de achá-la linda. E ela era-o, de facto. Magra, seca, com olhos verdes e pele morena, e o cabelo revolto. A minha prima C. era a rebelde da família, fazia o que queria, tinha a sua visão da vida e era determinada. Foi mãe solteira, ainda em adolescente e o rótulo que isto acarretava, numa aldeia pequena, foi duro, mas ela nunca deixou que isso a definisse. Não a via muitas vezes, mas sempre gostei dela. Quando soube no domingo que ela morreu soltei um palavrão e chorei muito, e ainda hoje choro. O facebook tinha-nos juntado, e comunicávamos mais através da internet do que alguma vez o fizemos antes. Ela era tão doce e presente, e um dia deixou-me mesmo embaraçada ao partilhar uma foto minha, com um orgulho indisfarçável. Há muito que queria falar com ela, queria dizer-lhe que gostava dela, que queria ajudá-la a superar a doença, que queria matar saudades e rever também o filho, o meu primo com quem passei longos verões na brincadeira e a jogar super Mario e que não vejo há muito (demasiado) tempo. E deixei passar a oportunidade, fui negligente e achava que tinha tempo, que ainda a ia ver e abraçar. Agora não posso dizer nada, e acho que é isso o que custa mais. Há pessoas que nos estão ligadas de uma maneira quase impossível, quando eu era pequena quase não a via ou tinha uma relação com ela, e com o passar dos anos percebi que apesar da distância estava próxima. Acho que é uma forma de amor. Quando falei com o meu pai acerca da negligência que a C. teve para consigo mesma ao ter uma doença grave de fígado e não se ter preocupado, ele disse "foi uma decisão dela, ela sempre fez o que achava bem e levou a vida que quis, e acho que nisso ela foi feliz". E de facto foi, acho que devo celebrá-la por isso em vez de lamentar.
Mas isto tudo faz-me pensar muito nisto das escolhas da vida. A C. pode ter sido negligente com toda a consciência, mas é tão fácil desligarmo-nos de nós e da nossa saúde sem querer. 
E traz-me ao dia de hoje, quando fui ao lançamento do novo livro da Catarina Beato, a pensar que tenho de reequilibrar a minha alimentação e voltar ao bom caminho para perder peso (sim, tive um percalço no caminho e já ando a estragar a dieta toda). Leio a Catarina há muitos anos e sempre me identifiquei com a escrita dela. Gosto muito da premissa deste livro ser uma busca pela felicidade, de reforçar a importância de merecermos comer boa comida, de nos tratarmos bem e nos mimarmos. E não tem de ser um tormento procurarmos o equilíbrio e a saúde. Só queria que a C. tivesse pensado nisto desta forma. 
Saí do Chiado inspirada e tranquila, feliz por ter finalmente conhecido a Catarina e ter-lhe dito o quanto as palavras dela significam para mim, apesar de ter parecido uma groupie. 
A vida por vezes é assim, perfeita nas imperfeições, recheada das lições que tiramos dos exemplos dos outros, sejam bons ou maus, e com as eternas saudades de quem nos deixa. E tenho neste texto dois exemplos de mulheres que perseguiram a sua felicidade, à sua maneira. A Catarina encontra-a no seu percurso que hoje partilha connosco e eu prefiro a opção dela. Mas quero acreditar que a C. também o conseguiu. E não quero esquecer-me disto, de saber escolher o meu caminho para ser feliz, onde quer que me levar.

1 comentário:

alva quase transparente disse...

As memórias e esse espírito livre que descreveste são preciosos. Guarda-os sem pensar no que deixaste de dizer e fazer. Com certeza ela sabe-o.

Um abracinho...não sei que dizer mais.